terça-feira, 26 de outubro de 2010

A faxina do altar

Tinha em casa um altar ecumênico. De Nossa Senhora de Aparecida à Preto Velho Jurubá, Avó Maria Conga, São Jorge e seu dragão, Santo Antônio, Santo Expedito em diversas versões e muitos outros. São Benedito não estava no altar, ficava na cozinha aguardando seu cafezinho matinal. Lá no altar sempre uma vela de sete dias acesa em prece. Curioso foi observar o comportamento de quem trabalhou na limpeza da casa diante do altar:
A moça crente passava ao largo e meio que se benzia. Jamais passou um pano de pó naquele móvel. Acho que sequer a vassoura chegava perto. Quantos rostos naquele altar! Que confusão?! Que heresia ignorante dos que crêem em imagens diziam seus gestos enfáticos.
Já a senhora, mineira, negra, que a despeito de ser católica praticante não se furtava ao poder dos pretos velhos, vez que até em sacis - o coisa ruim segundo ela – acreditava, e cria com veemência, já ela, diversamente da moça crente, acarinhava o altar. Limpava até a vela que reluzia com mais brilho depois que ela passava por lá com seus tantos apetrechos de limpeza. Agente tinha impressão, olhando de longe, que ela limpava e orava ao mesmo tempo. Era uma espécie de momento de fé num dia de faxina. Saia dali e as entidades todas estavam perfiladas, em uma ordem que ouso dizer era hierárquica, com Nossa Senhora de Aparecida bem à frente de todos. Não por outra razão senão porque era dela que vinha seu nome, sua força, sua graça. Dona Cida, Cidoca para os íntimos, era Aparecida, como tantas outras que pisam o solo desta terra brasileira. Devota mulher guerreira.
Essas memórias me ocorreram após ouvir a história de amiga, que me contou que seu filho, recém ingresso no mundo adulto, está por decidir religião irá escolher como sua. Muito estudioso, inteligente, pais intelectuais, o rapaz sai com uma que me remeteu a estas histórias de altar. Disse ele que se tiver que escolher religião preferirá a católica, pois que tem muito mais gente pra conversar do que as outras que não tem santos múltiplos com os quais compartilhar suas idéias matizadas pelo colorido dos sonhos de um jovem com uma mente brilhante.